AERO Magazine
Busca

A memorável passagem do Zeppelin pelo Brasil

O país preserva a torre de amarração de Recife e o hangar do Rio de Janeiro que serviram às operações dos balões dirigíveis alemães na década de 1930


Fotos: Arquivo pessoal do autor

Fotos: Arquivo pessoal do autor
Zeppelin atracado na torre de Jiquiá em Recife

Era a primeira vez que um aeróstato daquela natureza pousava na América do Sul. Nada mais justo, portanto, que se decretar um festejado feriado municipal. E foi o que o prefeito de Recife, Francisco da Costa Maia, fez. Mandou parar oficialmente a cidade para que todos pudessem recepcionar condignamente, e com a pompa merecida, o tal de "Zé Pélim". Quando o majestoso balão dirigível despontou finalmente na linha do horizonte, a leste da cidade, uma multidão estimada em mais de 15.000 pessoas (numa época em que a capital pernambucana possuía cerca de 295.000 habitantes), já o aguardava em êxtase e alguma impaciência, no campo do bairro de Jiquiá. No porto, navios acionavam freneticamente seus apitos enquanto, nas igrejas, os sinos repicavam, contribuindo em uníssono para provocar uma poluição sonora inédita até então. Assim, ao pôr do sol do dia 22 de maio de 1930, o imenso dirigível alemão Graf Zeppelin (conde Ferdinand Adolf Heinrich von Zeppelin) D-LZ127, prateado, proveniente da base de Friedrichshafen, na Alemanha, sobrevoou os céus de Recife depois de um voo non-stop conduzido pelo comandante Hugo Eckener desde Sevilha, na Espanha.

Embora o Graf Zeppelin cruzasse a cerca de 110 km/h, seus cinco motores Maybach VL2 de 12 cilindros e 580 hp, movidos a benzol ou "blaugas" (gasolina azul), funcionavam em idle (marcha lenta), sem nenhuma pressa. Em terra, muitas dezenas de auxiliares que haviam sido recrutados alguns dias antes e, como não haveria de ser diferente, sem experiência alguma na "arte" da amarração, trataram de agarrar-se firmemente às cordas grossas do dirigível para conseguir manter o "charuto porreta" fixado ao solo. Uma mulher, na ânsia de oferecer a sua singela ajuda àquela faina, amarrou a ponta de uma das cordas ao tronco de uma palmeira de macaúba, a qual naturalmente acabou sendo irremediavelmente arrancada do solo com suas raízes e tudo o que se encontrava à sua volta. Na capital pernambucana, as malas de correio foram repassadas para um Junkers Ju.52/3m do Syndicato Condor (leia mais no box à p. 77) e, imediatamente, despachadas para o Sul do País. Quanto aos ilustres passageiros, todos seguiriam a bordo do dirigível para o Rio de Janeiro, mas só alguns dias mais tarde.

Projetada por uma equipe liderada pelo engenheiro Ernest Besch, a torre de amarração montada no Campo de Jiquiá tinha, na ocasião, 16,5 m de altura e mais de três toneladas. Ela precisava ser pesada o suficiente para reter em solo o D-LZ127. Ali também havia uma fábrica com depósito de gás hidrogênio, estação de radiotelegrafia, uma pequena estação de passageiros e outras dependências que pudessem garantir a infraestrutura suficiente para a operação segura do Graf Zeppelin. Passados seis anos do primeiro pouso do dirigível alemão, a torre de atracação de Jiquiá precisou ser substituída por outra, mais alta três metros, montada com partes trazidas da Alemanha. A nova estrutura era suficientemente forte e alta para receber o Hindenburg D-LZ129, o novo dirigível de mais de 200 toneladas que o fabricante Luftschiffbau Zeppelin G.m.b.H. vinha se preparando para lançar na linha para o Brasil - a torre é a única ainda existente no mundo.


#Q#
Fotos: Arquivo pessoal do autor
Hangar com terminal de trem no Rio: construções preservadas
Fotos: Arquivo pessoal do autor

AEROPORTO NO RIO
De março a outubro de 1932, o Graf Zeppelin, com autonomia para percorrer 12.000 km, retornou ao Brasil outras nove vezes. E outras tantas vezes no ano seguinte. Mas faltava ainda construir um aeroporto à altura no Rio de Janeiro, projetado especialmente para receber e abrigar, com a segurança necessária, dirigíveis do porte do Graf Zeppelin, o que só ficou decidido em 1934. Hugo Eckener, que dirigia a empresa operadora do Graf Zeppelin, não escondia o seu desconforto por estar operando precariamente no Campo dos Afonsos, nos arredores da cidade. A topografia do terreno e a presença frequente de ventos cruzados costumavam expor a sua glamurosa "namorada" a riscos desnecessários. Principalmente por tratar-se de um enorme invólucro que levava no seu interior 20.000 m³ de gás hidrogênio, altamente inflamável e acondicionado sob muita pressão em 17 células individuais costuradas em tecido de algodão. As inúmeras camadas de tripas de animais, aplicadas umas sobre as outras no invólucro de hidrogênio é que impediam o gás de escapar.

Quando as partes interessadas sentaram-se à mesa, envoltas por densas nuvens da fumaça que emanava dos charutos cubanos, o governo finalmente aprovou a liberação de um crédito milionário para bancar a construção da infraestrutura aeroportuária necessária para a operação segura dos dirigíveis no Campo de Santa Cruz, em troca de um programa mínimo de 20 viagens anuais, pelo período de 30 anos. O terminal aéreo de quase 80 anos atrás, passaria, inclusive, a ser ligado à estação central do Rio de Janeiro por um ramal de estrada de ferro especialmente construído para esse fim. Um privilégio que nenhum moderno aeroporto brasileiro obteve até os dias de hoje.

Em princípio, os técnicos alemães não viam com bons olhos um aeroporto de dirigíveis localizado em Santa Cruz. Preferiam que fosse construído num lugar bem plano. E o mais próximo possível do mar. A proposta para a construção do aeroporto na baixada de Jacarepaguá tinha sido prontamente descartada em razão dos morros existentes pelas imediações. Outra área privada, pertencente a um aristocrata da época, parecia ser a melhor de todas as opções, mas o proprietário das terras, antevendo a magnitude do empreendimento proposto, teria inflacionado despudoradamente os valores, passando a pedir uma verdadeira fortuna pelas terras e inviabilizando o negócio.

Fotos: Arquivo pessoal do autor

OBRA FARAÔNICA
Os números da obra para a construção do aeroporto em uma área de cerca de 80.000 m², doada pelo Ministério da Agricultura, no bairro de Santa Cruz, eram faraônicas: o hangar, assentado sobre 560 estacas de sustentação, media 270 m de comprimento e tinha 52 m de largura interna, todo ele construído com peças de aço trazidas semiprontas por navio desde a Alemanha. O vão livre central tinha 70 m. Os portões, em ambas as extremidades, eram constituídos de duas folhas. O portão principal, no setor Sul, podia ser aberto em apenas seis minutos, com o auxílio de motores elétricos. Tudo isso já estimando a sua utilização para a operação do Hindenburg D-LZ129, de dimensões ainda mais extravagantes do que as do já extraordinário Graf Zeppelin.

MESMO EM GRANDES CENTROS URBANOS, COMO RIO DE JANEIRO, SÃO PAULO, CURITIBA E RECIFE, A PASSAGEM SILENCIOSA DO GIGANTESCO CHARUTO DIRIGÍVEL ERA MOTIVO DE FORTE COMOÇÃO

Cerca de 5.000 homens trabalharam alternadamente na construção do complexo aeroviário do hangar. Um terço da mão de obra era de origem alemã. O brasileiro Augusto Mouzinho Filho, que esteve presente desde o início das obras e durante todo o tempo em que o "zepelim" frequentou o Brasil, contava que a Luftschiffbau Zeppelin pagava um tostão para cada metro quadrado do terreno e 16 contos de réis para cada viagem que realizasse para o Rio. Uma espécie de taxa de utilização do aeroporto, estipulada de "pai para filho", e que servia para amortizar os 30.000 contos de réis que o governo havia adiantado à própria empresa, encarregada ela mesma de construir o hangar via Companhia Construtora Nacional Condor.

As novas instalações previam ainda a construção de uma usina com capacidade de produzir 3.000 m³ de hidrogênio por dia, além de depósitos de gasolina e óleo, mastro de amarração e outras instalações. No ano seguinte, graças aos recursos financeiros liberados pelo governo brasileiro, somados à preciosa tecnologia alemã, o Aeroporto Bartolomeu de Gusmão, como seria batizado, em Santa Cruz, estava praticamente concluído. No momento do pouso, mais de uma centena de homens postavam-se disciplinadamente espalhados pelo terreno, aguardando ansiosamente pelo momento em que os cabos de bordo fossem lançados. A proa era então atracada a uma torre de amarração telescópica de até 21,5 m de altura e a popa era engatada em um carro gôndola, que trazia o dirigível para o interior do hangar, onde então os passageiros podiam desembarcar em total segurança.


#Q#

ENCONTRO EM VOO
Em 1935, o Graf Zeppelin permaneceu "estacionado" no ar nas imediações de Recife por cinco dias inteiros, enquanto aguardava que a situação política do país se normalizasse. De abril até meados de novembro, realizou 16 viagens ao Brasil, conduzindo 572 viajantes, numa média de 35 passageiros a cada voo. O mesmo número de passageiros que pode atualmente ser transportado em um único voo do quadrirreator A380, da Airbus. No ano de 1936, com as instalações de Santa Cruz já quase concluídas e, conforme os compromissos que a Luftschiffbau Zeppelin havia assumido com o governo brasileiro, foram realizadas 20 viagens redondas entre a Alemanha e o Brasil: 13 operadas pelo dirigível Graf Zeppelin e as demais pelo seu irmão mais novo, o Hindenburg.

Fotos: Arquivo pessoal do autor
Passagem do D-LZ127 pela Basílica Menor de Curitiba (p. oposta) e pelo Viaduto Santa Ifigênia com edifício Martinelli ao fundo em São Paulo

Por volta das duas horas da madrugada de 31 de outubro de 1936, aconteceu algo inédito na história dos dirigíveis alemães: quando o Hindenburg fazia a viagem de regresso à Alemanha, encontrou-se em pleno oceano com o Graf Zeppelin, afastando-se da costa de Cabo Verde rumo ao Brasil. Conforme a mensagem telegráfica que foi enviada na ocasião, a lua estava muito clara naquela noite, permitindo que os passageiros debruçados sobre os beirais das janelas de ambas as embarcações, trocassem brindes e efusivas saudações com taças de champanhe francês e vinhos alemães. Cinquenta e seis dias depois, o aeroporto para balões dirigíveis Bartolomeu de Gusmão, em Santa Cruz, "o maior do mundo" foi finalmente concluído (desta vez, "pra valer"), e solenemente inaugurado pelo presidente Getúlio Vargas. Somente a Alemanha e o Brasil podiam orgulhar-se de possuir a infraestrutura aeroportuária apropriada para a operação segura de dirigíveis.

Na última viagem realizada naquele ano pelo aeróstato D-LZ129 ao Brasil, a tripulação do enorme dirigível, já impulsionado por quatro motores Daimler-Benz DB 602 (diesel) de 16 cilindros e 1.320 hp, aproveitou-se para promover um tour de boa vizinhança, percorrendo uma rota que sobrevoaria algumas pequenas cidades fundadas menos de um século antes por imigrantes alemães em Santa Catarina. Em uma entrevista a um jornal catarinense, Otto Kuchenbecker, recorda-se do dia 1º de dezembro de 1936, quando o gigantesco Hindenburg aproximou-se, lenta e silenciosamente, das cercanias de Brusque, onde morava, voando a pouco mais de 300 m de altura e refletindo intensamente ao longo dos 250 m de comprimento do invólucro de tecido de algodão, os primeiros raios de sol. Ao deparar-se com aquele charuto colossal prateado pairando sobre sua cabeça, muita gente em terra caiu em prantos, saudando com os lenços brancos a aproximação da aeronave. Muitos, contudo, se assustaram.

A passagem do Hindenburg por Blumenau foi saudada efusivamente pelas sirenes das fábricas e pelos sinos de igrejas. A jovenzinha Irany Alice, a quem chamavam pelo apelido de "Nini", filha mais moça de dona Clara Zimmermann, uma "alemãzona sacudida" com grandes olhos azuis, até aquele dia não tinha visto sequer um avião que fosse em sua vida rude de descendente de imigrantes. Diante da imagem aterradora que encobria "uma parte dos céus da cidade", Nini tratou rapidamente de esconder-se enquanto ainda era tempo, convencida de que o mundo "iria acabar" naquele dia...

Mesmo em grandes centros urbanos, como Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Recife, a passagem silenciosa do gigantesco dirigível era sempre motivo de forte comoção. Até porque o Hindenburg, que deslizava sobre suas cabeças, exibindo em seu charuto marcas de identificação com quase dois andares de altura, tinha comprimento equivalente ao de três Airbus A380 alinhados um após o outro!

Fotos: Arquivo pessoal do autor
O salão de refeições do balão dirigível (acima) e a mobilização de voluntários para a amarração do Zeppelin

É TUDO INFLAMÁVEL
Os tripulantes e passageiros do dirigível ficavam acomodados em uma grande gôndola construída na parte externa do invólucro, sob a seção anterior. Na área onde a tripulação chamava de Convés B, ao contrário do Graf Zeppelin, o Hindenburg possuía um "salão de fumar", que vinha precedido de um pequeno bar, cujas amplas janelas panorâmicas proporcionavam uma esplêndida vista da paisagem sobrevoada. Dos 60 tripulantes que serviam a bordo, 35 dedicavam-se exclusivamente a atender aos passageiros. Os 25 camarotes, com duas camas cada um, guarda-roupas e sofás, chuveiros de água fria e quente, amplos salões de estar e de refeições, acarpetados, com 70 m² (onde eram servidas memoráveis delicatessens regadas a vinhos brancos "nacionais"), janelas que podiam ser abertas para fora durante o voo, elevador funcional, cozinha e outras tantas mordomias, faziam com que o Hindenburg se pare cesse mais com um convidativo transatlântico voador. A ausência de ruídos a bordo era absoluta. Dizia-se que era possível ouvir os cães latindo em terra.


#Q#

Afora os nomes predominantemente de origem alemã, registrados de próprio punho nas listas de passageiros, como Schreiber, Hermann, Stuessel e Kohepp, de vez em quando despontavam entre eles figuras proeminentes da sociedade brasileira. Como no dia em que o maestro e compositor Villa-Lobos embarcou no "zepelim". Ou quando o então coronel aviador da Aviação do Exército, Eduardo Gomes, viajou na companhia de sua mãe, dona Geny. O próprio presidente Getúlio Vargas aceitou uma carona retornando de uma viagem, do Norte do País para o Rio de Janeiro a bordo do Graf Zeppelin.

O casal de mineiros, José Procópio Filho e sua mulher, Petina, viajaram no Hindenburg em 1937. Quando o dirigível manobrava para pousar no Rio de Janeiro, algumas fagulhas desprenderam-se dos motores, saltando para dentro do invólucro. Procópio apavorou-se com aquilo que viu. "Petina", disse para a sua mulher, em tom de despedida, "nós estamos perdidos aqui nesse negócio. É tudo inflamável!".

Naquele ano, foram realizadas apenas mais três viagens quinzenais da programação prevista de 22 voos para o Brasil, antes do serviço transoceânico - único em todo o mundo -, ser definitivamente encerrado. O incêndio, que consumiu em minutos o D-LZ129 Hindenburg durante as manobras de atracação para o pouso fatídico de Lakehurst, em Nova Jersey, nos Estados Unidos, em maio de 1937, levantou suspeita sobre a segurança a respeito da operação dos "zepelins". Morreram no acidente 35 dos 97 ocupantes, entre tripulantes e os passageiros. Até hoje persiste uma versão de que a tragédia de Lakehust tenha sido o resultado de um ato de sabotagem.

Em consequência da rápida deterioração das relações diplomáticas com o governo alemão, no início de 1942, foi declarada a caducidade da concessão de voo para a Luftschiffbau Zeppelin explorar a linha de dirigíveis entre a Europa e o Brasil. O mesmo decreto-lei autorizava ainda que o Ministério da Aeronáutica efetuasse a imediata ocupação de toda a área do Aeroporto Bartolomeu de Gusmão, transformado-a na Base Aérea de Santa Cruz.

EX-TRIPULANTES
Oito ex-tripulantes do Graf Zeppelin visitaram Recife em 1981, como parte das comemorações do cinquentenário da primeira viagem do dirigível ao Brasil. O mais ilustre de todos era o comandante Oskar Fink, conhecido por suas atitudes amáveis, que estivera no Brasil por 18 vezes seguidas. Ele conta justamente a passagem envolvendo o presidente Vargas em sua visita ao Norte do país a bordo do navio "Almirante Jaceguai", da Marinha de Guerra. Na oportunidade, o Graf Zeppelin sobrevoou a embarcação e o comandante Fink mandou descer uma pequena cesta presa à extremidade de uma longa corda, contendo duas garrafas de vinho do Reno com os votos "de uma feliz viagem" ao presidente. Getúlio, que era entusiasmado pela aviação, preferiu voltar ao Rio de Janeiro a bordo do Graf Zeppelin, "escoltado" pelos aviões da Aviação Naval.

Na capital pernambucana, os velhos aeronautas, recebidos por Gilberto Freyre, como aconteceu no passado (nos anos 30, o sociólogo era chefe de gabinete do governador de Pernambuco e ficou encarregado de dar as boas vindas aos ilustres visitantes do voo inaugural do dirigível para o Brasil), quiseram rever o que havia restado intacto da torre de amarração do "Aeroporto de Jiquiá", no subúrbio de Afogados. Ela é, de fato, a única construção desse tipo ainda preservada em todo o mundo. Para quem chega pelo ar a Recife, ainda é possível visualizar a torre do "Zé Pélim" durante a aproximação final para o pouso no elegante Aeroporto Internacional dos Guararapes. A excelente qualidade do aço empregado na estrutura da torre foi o que impediu que ela se deteriorasse com o passar dos anos. Só depois que se passaram 50 anos da sua construção, é que, a pedido da Fundarpe (Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco), a torre de amarração de Jiquiá foi finalmente tombada pelo governo do estado.

Fotos: Arquivo pessoal do autor

Depois, a comitiva seguiu de avião para o Rio de Janeiro. No interior da Base Aérea de Santa Cruz, permanece intacto, imponente, até os dias de hoje, o primeiro - e único - hangar construído no Hemisfério Sul especialmente para abrigar os dirigíveis alemães que seguiam em voo comercial de passageiros, correio e carga para a América do Sul. Não restou em pé nenhuma outra edificação desse tipo em todo o mundo. O hangar de dirigíveis do Rio de Janeiro, que passou a servir de abrigo para as dezenas de aeronaves lotadas na Base Aérea de Santa Cruz, foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 1998. Seu irmão gêmeo, construído anteriormente no Campo de Friedrichshafen, às margens do lago Constança, já havia sucumbido prematuramente diante das perspectivas de uma nova guerra que se avizinhava na Europa. O governo alemão preferiu desmontá-lo e dar um novo destino às toneladas de aço utilizadas na sua construção.

Uma parte considerável das preciosas anotações de bordo referentes à operação transoceânica do Graf Zeppelin, que também foi desmontado para a reusinagem do metal empregado na sua construção, foram encaminhadas para enriquecer o acervo do museu alemão de dirigíveis de Friedrichshafen. Era de lá que os dirigíveis partiam desde o início, para voar rumo ao Brasil. Após o misterioso acidente com o Hindenburg em 1937, e apenas um ano após haver sido inaugurado o hangar brasileiro, a operação dos dirigíveis alemães foi definitivamente encerrada. Desde então, nunca mais o mundo viu nada igual. Ou parecido.

Via aérea entre Brasil e Alemanha
Transporte aéreo de passageiros brasileiro nasceu da parceria com alemães

As atividades voltadas ao transporte aéreo de passageiros no Brasil surgiram trazidas por empresas comerciais alemãs de ponta, que contavam com o suporte da poderosa Deutsche Luft Hansa - uma operação dissimulada, mas efetiva. Desde antes de 1930, a empresa do grou, como era conhecida, numa referência à grande ave voadora, mensageira da boa sorte e longa vida, já sonhava alto. A ideia era ligar a Alemanha a países localizados em outros continentes por via aérea. Mas, para ter como concretizar esses planos audaciosos, seria preciso que houvesse nesses destinos uma infraestrutura sólida e confiável o bastante para garantir a continuidade dos voos intercontinentais. No Brasil, a empresa que hoje é conhecida graficamente como Lufthansa, esteve intimamente presente na organização e criação do Syndicato Condor e da Varig. A primeira, funcionando como sua subsidiária, e para a qual a matriz alemã transferia, sempre que havia necessidade, novos equipamentos de voo, tecnologia de ponta e, até mesmo, os próprios pilotos e mecânicos, formados e muito bem treinados nas melhores escolas de voo alemãs. Tudo para ter garantido o bom funcionamento da empresa que, mais tarde, seria rebatizada com a denominação nacionalista de Cruzeiro do Sul.


Paulo F. Laux | | Fotos Arquivo Pessoal Do Autor
Publicado em 03/10/2012, às 12h30 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45


Mais História